quinta-feira, 31 de janeiro de 2019

Olhares da Chamusca (Quadras da Exposição Conjunta (2018) com Rosário Sousa e Catarina Centeno, artistas plásticas)


Geraram-te mulher, Chamusca bela,
Pincelada nas tuas cores da alegria.
Esticaram-te pela campina singela
os toiros bravos de tinta sombria.

Cavalos montados com destreza
exibem os trajes de arrojo e suor,
quando engalanados com beleza
entregam-se à faina com fulgor.

O teu retrato dos meus jovens dias,
lembra-se saudoso no nosso olhar,
das tuas gentes de lutas sadias,
de voz quente sempre a reinar.

Aquecem-te com tinto as goelas
e ensaiam acordes do fado maior.
Adormecem-te nas noites belas
ou no leito aguado de um luar pior.

Chamusca, porto da Lezíria serena,
dona de um cais regaço de gentes,
que aportavam afoitas na água plena
ou esticavam as suas redes urgentes.
   
Pescavam os peixes doces e certeiros
das bateiras, barcas e árduas canoas
e envolviam-se no sonho dos avieiros
dando asas penosas às Tágides boas.

Ó Chamusca enlaça a nossa poesia
nas tuas terras margens de aluvião!
Espalha a seara multicolor de dia
aquecendo-a no teu sol de paixão.

Ainda escuto as mulheres lavando
no seu porto de partidas fluviais.
Batem roupa dos que vão chegando
e choram os que não voltam mais.

Mulher arrojada de bravura taurina
e como elas lavas o teu belo rosto.
Mantém a jovialidade de uma menina
e trabalha animada até ao sol-posto.

Com o nosso olhar simples, ó Chamusca,
pinta-se e escreve-se duma vila bela.
Assim a terra branca de gente fusca,
será sempre mote de amor por ela.

Chamusca, se os nossos olhos te amam
é porque sabem bem o que é amar…
Não carecem da beleza que clamam,
deixando para sempre este nosso olhar.

Cigano (Soneto)

Rosário Sousa