O dia muito chuvoso fazia-me prever algo negativo, quiçá a derrota, mas, bem lá no fundo do meu coração, ainda residia a esperança. Tinha plena consciência que seria difícil voltar a vencer, dado que a 11 de novembro já havia recebido o Prémio Melhor Obra 2018. No entanto tinha fé, uma fé muito escondida no meu coração, porque os familiares, os amigos votavam diariamente. Inclusive um grupo de colegas autores votavam no meu livro, tal como eu votava no deles. Estava tudo em aberto, mas essa concorrência bastante cordial e parceira naquela votação era fiel e verdadeira.
Havia feito o trabalho de casa, preparando o discurso em papel, mas durante os dias que antecederam a Gala dizia para mim própria: "E se perder? E se desiludir as pessoas que votaram em mim? Vou-me sentir péssima!" E insisti publicando quase até à exaustão num apelo constante à votação para não desiludir ninguém nem a mim mesma. A atenção e a confiança dos leitores, familiares e amigos eram maiores do que a minha. Muitas vezes me asseguraram: "Vai vencer. Claro que vai vencer!" E eu retorquia: "Não sei. Não será fácil um livro vencer pela segunda vez." As certezas das pessoas eram muitas, mas deviam estar equilibradas com as minhas dúvidas.
A tarde da Gala chegou e o meu nervosismo misturou-se com sorrisos, beijos e abraços, tentando fazer-me mais forte do que na realidade me sentia.
O título da obra vencedora na categoria romance foi anunciado e eu lá embasbaquei mais uma vez com as palmas. "Venci!" - gritei, surdamente. Um misto de sentimentos assolou-me à mente. As vozes pequeninas na minha cabeça, à medida que me aproximava do palco, repetiam: "Venceste, mulher! Como é possível? Outra vez? Agora tens a parte do discurso! Lá te vais enervar outra vez de voz entrecortada e aos solavancos! Ainda por cima és a única que levas papel! Que hão de pensar? Que sabias que ias vencer? Mentira! Nunca soubeste! Nem adivinhaste! Ninguém te disse! Apenas fizeste o teu trabalho de casa! Se a editora te tinha avisado e aos teus colegas que tínhamos que levar discurso preparado… Gostaria de falar de improviso, saía tudo mais natural e autêntico. Assim vai parecer uma encenação certa e direitinha! Queira Deus que a colega que vieste representar vença, para leres o discurso dela, senão vai ser mau! Se ela vencer, tiras a túnica e os óculos para pareceres outra! Vais andar às apalpadelas! Vamos a isso, Paula Araújo! Vais conseguir subir a este palco sem te espetares no chão! Jesus, tanta luz, não vejo nada!"
Cheguei ao palco e o apresentador apelava a um discurso curto e eu levava um camião de palavras. Teria que me apressar, mas os meus nervos não me deixavam. Acelerei o que pude. Daquele lugar agradeci não ver o público com tanta luz. Sinceramente não sei como vi as letras, mas havia tido a feliz ideia de colocar os carateres a Arial tamanho 14. O apresentador ao meu lado olhava para a dimensão da minha composição. Parecia mais aflito do que eu para terminar. Julgo que tinha a ver com a duração do direto. Não li o último parágrafo. Voltei ao meu lugar com uma imensa vontade de chorar e de beijar aquele troféu. Beijei-o na escuridão, confesso. Tinha-o ali nas minhas mãos e tê-lo era o reconhecimento que o meu público, familiares, amigos, leitores em geral, gostavam de mim, me apoiavam e me acompanhavam sempre nestes desafios. Sentia-me tão grata por tudo isso.
Um livro dá muito trabalho a escrever, mas esse trabalho é compensado pelas manifestações de carinho e de apoio das pessoas que acreditam que temos valor. E quando o mesmo livro nos permite o alcance de três prémios, sentimo-nos orgulhosas por termos amigos assim.
Os três troféus estão comigo, mas eles são de todos os que me apoiam. Foi o meu público que me possibilitou recebê-los. Para mim são mesmo três e simbolizam o amor, a amizade e o companheirismo.
Muito obrigada a todos pela confiança demonstrada mais uma vez por mim!
Cara amiga, pode estar a agradecer aos seus leitores (ou não) os prémios que tem recebido mas, sem o seu trabalho e o seu talento, certamente não os teria conseguido.Parabéns mais uma vez.
ResponderExcluirAgradeço as suas palavras. O talento, empenho e dedicação são necessários para se conquistar um prémio ou um troféu, mas, neste caso, entendi que devia agradecer porque se tratou de uma votação online. Muito obrigada pela sua atenção.
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