Era uma vez uma boneca diferente de todas as bonecas do mundo. Diferente porque não era de plástico. Porque não era de porcelana. Porque não era de vidro. Nem de outro material como as bonecas das lojas de brinquedos ou dos hipermercados.
Esta boneca era diferente porque era feita
de um material muito especial, muito fofo. Tão fofo, tão fofo, que parecia uma
ursinha. Uma boneca ursinha de pêlo castanho muito claro. Pois ela mal
conseguia vestir vestidos, porque ficava muito gorda com o seu corpo peludo. Mal
conseguia calçar sapatos, porque os pés inchados não cabiam neles. Não
conseguia usar chapéus, porque o cabelo escuro em carapinha, era tão grande,
que era quase o dobro dela.
As meninas viam-na sentada num sofá da sala
da escolinha e diziam:
-
Que boneca tão feia! Parece uma macaca peluda!
-
Não quero brincar com ela! Mete medo!
-
Não é bonita como as outras bonecas!
Ela tinha uma cara fofinha. Tão fofinha que
apetecia apertar-lhe as bochechas. Os olhos eram cor de mel, redondos como duas
bolachinhas. O nariz era abatatado como o de um palhacinho e a boca tinha um
sorriso muito grande. Parecia tão simpática, mas para as meninas não era bonita,
por ser diferente.
A boneca estava sempre sozinha, sem que
alguém quisesse brincar com ela. Passava os dias sentada a olhar para as outras
bonecas que andavam de mão em mão, de colo em colo, de carrinho em carrinho,
tornando as meninas felizes.
Os dias passavam e a boneca via as meninas
a ir para casa. Não olhavam para ela, nem queriam pegar nela. Apenas as
educadoras lhe sacudiam o pó e voltavam a colocá-la no mesmo lugar.
Porém houve um dia que chegou à escola uma
menina que não conhecia ninguém. Chamava-se Celinda e os olhos dela eram da cor
das amêndoas, os lábios vermelhos e rechonchudos da cor dos morangos. O nariz
abatatado esticava-se num rosto muito moreno.
Era uma linda menina, mas não queria falar
com ninguém. Não queria brincar com as outras meninas, mas elas também não
brincavam com ela porque a achavam diferente, e ela encostava-se a um cantinho,
um pouco triste e não sorria todo o dia.
Às escondidas da professora, as meninas
eram más para a Celinda e chamavam-lhe nomes estranhos, que a boneca não
percebia:
-
Celinda…catinga!
-
Mulatinha da Guiné!
-
Carapinha sempre em pé!
-
Pé de chulé!
As meninas riam de Celinda. Faziam-lhe
partidas e chamavam-lhe nomes feios. Zombavam dela por ter uma cor diferente.
Uma cara diferente. Umas mãos diferentes.
A
boneca, sentada no seu sofá, admirava Celinda, sozinha e triste.
Então, houve um dia, que a menina finalmente reparou
nela. Aproximou-se devagar, e sem medo. Depois tocou-lhe no corpo fofinho e
sorriu, mostrando um sorriso lindo, que as outras meninas não viram.
Segurou a boneca e embalou-a nos braços, encostando-a
de vez em quando ao rosto.
-
És tão linda, minha ursinha! – Disse, muito feliz.
Sentou-se no chão da sala e começou a
brincar com a boneca, falando com ela.
-
Não és de ninguém, pois não? Agora és minha, a minha boneca.
Levantou-a ao ar e colocou-a em cima do
pescoço.
-
És mesmo fofinha! Porque que é que não gostam de ti, boneca ursinha? Até me
podes aquecer no inverno!?
As outras meninas pararam de brincar para
olhar para elas. Depois aproximaram-se lentamente. Uma sentou-se de pernas
cruzadas ao lado dela e perguntou-lhe:
-
Achas que essa boneca é bonita?
-
Não é só bonita! É muito macia e fofa! Pega nela!
E a menina pegou na boneca, encostando-a
depois à cara dela.
-
Faz-me tantas cócegas, mas é fofinha! Que linda é a minha boneca ursinha!
As outras meninas também quiseram pegar nela
e sentaram-se à frente de Celinda, curiosas, pondo as suas bonecas de
lado.
-
Como é que se chama? – Perguntou uma delas, brincando com os caracóis da carapinha.
-
Não sei, mas vou-lhe chamar Ursara! – Disse Celinda, sorrindo. – Se é uma boneca
ursinha! Vai ser a minha Ursara!
-
Que nome giro!
-
Tu até és parecida com ela! Pareces a mamã dela!
-
Sou mesmo! – Riu Celinda. – Sou como a minha boneca!
-
Podemos brincar todas juntas com as nossas bonecas. – Sugeriu uma outra menina.
-
Viva a Celinda e a sua boneca! Viva! Vivam as nossas bonecas também! – Festejou
uma das meninas, que começou aos saltos com a sua boneca.
As meninas pularam de felicidade. Então Celinda
começou a brincar com elas e a trocar a sua com outras.
Ursara estivera ali tanto tempo e nenhuma
das meninas a vira. Teve que aparecer uma menina diferente para a tornar igual
a todas as bonecas da sala.
A partir daquele momento seriam todas iguais,
as meninas e as bonecas.
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